Anualmente, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) apresenta um panorama em formato de Relatório de Monitoramento Global da Educação, sobre as condições educacionais ao redor do mundo. 

Veja também o Relatório da UNESCO de 2022: Um novo contrato social para a Educação! Clique abaixo

Um novo contrato social da educação: Relatório da UNESCO
O Relatório da UNESCO é um conjunto de diretrizes para que possamos, enquanto sociedade, buscar por uma pedagogia muito mais diversa, inclusiva e baseada na cooperação e solidariedade.

O documento deste ano foi divulgado oficialmente no dia 26 de julho, e teve como objeto de análise a relação entre educação e tecnologia. Intitulado “A Tecnologia na Educação: uma ferramenta a serviço de quem?”, o estudo traz dados e informações para que se possa refletir acerca da verdadeira aplicação das tecnologias nos processos educacionais. 

Segundo a declaração, o Relatório de Monitoramento Global da Educação (Relatório GEM), tem como objetivo ser o mecanismo para orientar o monitoramento e a elaboração de relatórios sobre o ODS 4 (Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos) e sobre a educação nos outros ODS propostos. 

“Com a responsabilidade de informar sobre a implementação de estratégias nacionais e internacionais para ajudar todos os parceiros relevantes a se responsabilizar por seus compromissos como parte do acompanhamento e da revisão geral dos ODS.”

Antes de apresentar os dados propriamente ditos, o relatório traz algumas reflexões iniciais bastante importantes sobre os impactos que algumas tecnologias têm na pedagogia. 

Algumas delas, por exemplo: O ensino online evitou o colapso da educação durante o fechamento das escolas durante a pandemia da COVID-19; A tecnologia digital aumentou de forma dramática o acesso a recursos de ensino e aprendizagem; A tecnologia deveria se concentrar em resultados de aprendizagem, e não em contribuições digitais. 

Qual o impacto de adquirir uma tecnologia apenas para “tapar um buraco?” 

Nesse primeiro momento queremos unir esse questionamento trazido pelo Relatório GEM, com uma afirmação bastante latente nas discussões educacionais que participamos: A tecnologia precisa ter intencionalidade pedagógica! 

Explicando um pouco mais sobre essa última ideia, intencionalidade pedagógica se refere basicamente a tudo aquilo que é desenvolvido tendo a inovação acadêmica e a melhoria dos processos educacionais como foco principal. 

Por exemplo: Utilizar um sistema de videoconferência genérico soluciona um problema pontual (conectividade online), mas pensando um pouco mais a longo prazo a qualidade do ensino a distância é comprometida pela falta de recursos educativos. 

Outro ponto importante apontado ao longo do documento é referente aos riscos que as tecnologias não regulamentadas trazem à educação. Segundo a UNESCO, ao passo que os dados de usuários (incluindo crianças) vêm sendo expostos, somente 14% dos países garantem por lei a privacidade dos dados na educação. 

“Uma análise descobriu que 89% dos 163 produtos de tecnologia recomendados durante a pandemia tinham a capacidade de coletar dados de crianças. Ademais, 39 dos 42 governos que ofereceram educação online durante a pandemia acomodavam usos que colocavam em risco ou infringiam os direitos das crianças.”

Portanto, ao mesmo tempo em que a tecnologia digital se tornou indispensável na educação, principalmente se pensarmos no ensino superior, é inevitável questionarmos até que ponto ela é benéfica. E a resposta realmente não é fácil, mas podemos começar analisando alguns pontos principais:

  1. Todos (ou pelo menos a grande maioria) dos alunos terão acesso fácil a essa tecnologia?
  2. Qual a empresa está por trás desse desenvolvimento? 
  3. Em relação à Lei Geral de Proteção de Dados, como essa empresa se comporta?
  4. A segurança dos dados de alunos e professores será garantida pela empresa?
  5. Essa tecnologia complementa o processo de ensino e aprendizagem?

Como a tecnologia ajuda a resolver os desafios da educação? 

Primeiro de tudo, e um dos pontos mais frisados pelo Relatório GEM, é que precisamos parar de discutir as tecnologias educacionais focando na tecnologia em si. É hora de voltarmos o olhar para a educação, e nos perguntarmos: Quais os reais desafios da educação a nível mundial? 

O documento segmenta três categorias principais de questionamentos, sendo elas:

Igualdade e inclusão: O cumprimento do direito de escolher a educação que se deseja e realizar seu potencial por meio da educação é compatível com o desafio da igualdade? Em caso negativo, como a educação poderia se tornar a grande equalizadora?  

Qualidade: O conteúdo e a oferta da educação proporcionam as bases à sociedade para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável? Em caso negativo, como a educação pode ajudar os estudantes não somente a adquirir conhecimento, mas também a serem agentes de mudanças? 

Eficiência: O arranjo institucional atual de professores ensinando estudantes em salas de aula fornece as bases para o alcance da igualdade e da qualidade? Em caso negativo, a educação será capaz de equilibrar a aprendizagem individualizada e as necessidades de socialização?

Adentrando um pouco mais o espectro das tecnologias digitais, uma vez se evidenciando quais esses desafios latentes e emergentes da educação, é necessário refletir de que forma deve acontecer a inclusão das inovações. E para além disso, quais os benefícios tangíveis que essa tecnologia pode oferecer para o processo de ensino? 

“Embora essas tecnologias tenham um potencial imenso, muitas ferramentas não foram concebidas para aplicação na educação. Não se tem dado atenção suficiente à forma como essas ferramentas são aplicadas na educação, e menos ainda a como deveriam ser aplicadas em diferentes contextos educacionais.”

Tecnologias educacionais: a importância do contexto e apoio

Tratando-se de novas tecnologias, é evidente que não faltam opções às Instituições de Ensino - reforçando sempre o ponto que trouxemos anteriormente, de que não é porque a empresa vende determinado produto como educacional, que ele realmente é. 

Conforme o estudo, as aulas gravadas podem mitigar lacunas de qualidade de instrução e melhorar a alocação de tempo do professor. Para reforçar isso, é apresentado o seguinte cenário:

“Na China, gravações de aulas com professores da zona urbana que ofertam um ensino de alta qualidade foram fornecidas a 100 milhões de estudantes da zona rural. Uma avaliação de impacto apontou uma melhoria de 32% nas habilidades tanto de matemática quanto de língua chinesa e uma redução de longo prazo de 38% na lacuna salarial entre zonas rural e urbana.”

Mesmo assim, oferecer apenas a tecnologia ou o material didático sem qualquer tipo de contextualização e apoio não é o suficiente, como apontado. 

“No Peru, o Programa Um Laptop por Criança distribuiu cerca de 1 milhão de laptops carregados de conteúdo, mas isso não resultou em qualquer impacto positivo na aprendizagem; em parte, devido ao foco na oferta de aparelhos, e não na qualidade da integração pedagógica. “

Educação e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 

Todas as ações governamentais a nível mundial voltadas à melhoria dos processos educacionais são, sempre, alinhadas com as metas determinadas pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Em especial o ODS 4, que trata mais especificamente sobre a promoção da equidade educacional. 

Em todas as submetas (delimitações dentro da meta 4 dos ODS), o Relatório entrega dados sobre participação, eficiência e uso das tecnologias a favor da educação. 

Um desses, por exemplo, é referente a equidade na educação. Nas últimas décadas, segundo o documento, o progresso no acesso e na conclusão da educação de meninas tem sido uma das principais conquistas.

“Por exemplo, no Chade, o número de meninas matriculadas para cada 100 meninos aumentou de 45 em 2015 para 58 em 2021; na Guiné, aumentou de 65 em 2015 para 72 em 2020”.

Em resumo, o Relatório GEM faz um panorama global para relacionar educação e tecnologia sob a perspectiva de compreender se essas inovações trazem realmente benefícios ao processo, ou distanciam ainda mais o estudante da sala de aula. Levando em consideração, principalmente, a desigualdade de acesso. 

Um dos exemplos é a conectividade, considerada primordial e um direito à educação. Entretanto, as proporções de acesso ao redor do mundo são bastante desiguais. Hoje, apenas 40% das escolas primárias promovem a conectividade, seguido de 50% de primeiro nível da educação secundária e 65% das escolas de segundo nível da educação secundária. 

Ao final, a UNESCO retoma a provocação inicial do relatório com a seguinte questão: Será que as sociedades estão fazendo as perguntas certas sobre a educação antes de recorrer à tecnologia como uma solução? 

“Este relatório recomenda que a tecnologia seja introduzida na educação com base em evidências que demonstrem que ela seria apropriada, igualitária, escalável e sustentável. Em outras palavras, seu uso deve atender aos melhores interesses dos estudantes e complementar uma educação baseada na interação humana. Ela deve ser vista como uma ferramenta a ser usada nesses termos.”