Os desafios enfrentados no Brasil
A graduação, pós graduação e demais cursos livres já são populares no formato de EAD. Sabemos que cada vez mais pessoas aderem a esse modelo de ensino. Por ser atrativo em função de valores e autonomia de estudo, acaba se transformando numa proposta bastante agressiva para universidades e demais instituições que oferecem, em sua maioria, ofertas presenciais.
No entanto, nos últimos anos começaram os debates acerca da educação a distância também para o ensino médio. Até então, para alguns casos, essa modalidade já era aprovada: como o ensino para regiões de difícil acesso e algumas opções de educação domiciliar no caso de enfermidades. Agora, pensa-se em como expandir o seu uso visando sua incorporação na BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e suas premissas para o novo ensino médio, como os itinerários formativos (falaremos mais sobre eles abaixo).
Nova legislação para a EAD no Ensino Médio
Em 2018 foram aprovadas as novas diretrizes curriculares para o ensino médio. Sendo assim, é possível optar pelo ensino a distância em até 30% na carga horária em cursos noturnos, 20% para educação diurna e até 80% para o EJA (educação de jovens e adultos). Essa normativa vigorará a partir de 2019 sob a autorização dos conselhos locais através da reformulação dos currículos escolares.
Na prática poderíamos supor que, pensando no ensino médio diurno onde os estudantes compõem 5h diárias, será possível cursar 1h desse tempo em EAD. Para o CNE (Conselho Nacional de Educação) é preferível que se priorize o percentual de EAD para a formação específica regulamentada pelo novo ensino médio como os itinerários formativos, mas também poderão ser aplicadas para disciplinas comuns como português ou matemática.
O que são itinerários formativos? No novo ensino médio foram aprovados 60% da carga horária total para atividades comuns e 40% para atividades específicas escolhidas pelos estudantes. Os itinerários formativos compõem esses 40% que são definidos por atividades, oficinas, estágios, voluntariado etc., dentro da área de interesse do aluno. Entenda mais sobre os itinerários formativos aqui. Seu objetivo é a possibilidade de personalização do ensino através dos interesses de cada estudante e uma “pré” escolha sobre seus caminhos após o ensino médio como uma universidade ou um curso profissionalizante. Devido a essa mudança na educação básica, também será necessário um novo olhar para o ENEM. Este também contará com uma parte da prova comum para todos os alunos e outra parte especializada conforme a escolha do itinerário formativo.
Qualquer tipo de atividade ou aula a distância deverá ser acompanhada por um professor ou coordenador previamente autorizado pela escola e, além disso, fazer parte do currículo escolar do estudante.
O suporte para a etapa EAD será através das tecnologias educacionais como ambientes de aprendizagens, objetos de estudo e demais recursos e plataformas virtuais e não virtuais.
Educação EAD é um desafio no Ensino Médio
Quando falamos sobre educação básica estamos nos referindo (teoricamente) à estudantes entre 6 e 18 anos de idade. Sabemos que esse dado é mutável conforme a realidade de cada região, escolas, questões políticas, socioeconômicas, entre outros fatores. No entanto, indiferente da realidade de cada um é inegável a importância dessa etapa para o desenvolvimento de qualquer indivíduo. São as bases que o consolidam e se encarregam, pelo menos em parte, das suas escolhas futuras. Como parte integrante da educação básica, temos o ensino médio, sendo este o último ciclo antes do ensino superior. No Brasil, contamos com a qualidade desse ensino para acesso, principalmente, a universidades estaduais e federais. Tanto para conseguir notas saudáveis no vestibular quanto no ENEM.
Além disso, contamos com um país com uma das maiores extensões e diversidades territoriais e sociais. Isso só ilustra a grande diferença entre públicos e nível de acesso a educações de qualidade. Dentre todas as opções de ensino, temos a educação pública e a privada, compreendendo sua grande disparidade com relação à qualidade. Juntando todos esses fatores, chegamos a uma matemática simples: os que alcançam e os que não alcançam seus objetivos acadêmicos e profissionais.
Tendo em vista tantas subjetividades temos a educação a distância como uma grande reflexão sobre nosso contexto educacional e onde queremos chegar enquanto nação brasileira. Somos mais de 200 milhões de habitantes em todo território nacional. Deste número, pelo menos 52%, entre 25 e 64 anos, não concluíram o ensino médio conforme dados da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Se formos pensar em ensino superior, temos menos de 20% de jovens e adultos concluintes segundo dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Ficamos com a medalha de prata da lista da OECD de países com maior nível de desigualdade de renda, perdendo apenas para a campeã Costa Rica.
Ainda estamos engatinhando no quesito educação, testando e validando métodos e formatos diferentes de ensino e aprendizado. Com isso, muitas turbulências políticas e reformas que são boas para uns e ruins para outros. Temos um cenário complexo, mas uma necessidade bastante explicitada: educação que ainda alcança poucos e qualifica privilegiados.
Desafios pedagógicos
Na infância e adolescência o convívio com os outros se faz presente e necessário, como sempre defendeu Vygotsky. Para ele, o meio em que vivemos é essencial para a constituição de quem somos, aprendemos e reconhecemos. O contato com o outro é de fato importante. Além disso, em comunidade aprendemos sobre o convívio, regras, cidadania, conduta e ética. Aprendemos a viver em sociedade. A escola tem um papel fundamental, vai muito além dos componentes curriculares e competências cognitivas. Ela atua na nossa completude: no ser social, emocional, espiritual (crenças e dogmas), racional. Nos ensina a sermos politizados, articuladores, argumentadores, questionadores, entre tantas outras habilidades.
A escola nos ensina a entender o papel e importância de cada um para o bem maior da comunidade, desde o professor, orientador, merendeira, instrutor e tantos outros agentes necessários para que a orquestra escolar funcione harmonicamente.
Quando pensamos na EAD precisamos ter a maturidade e o discernimento para compreender que jovem ou adulto é esse que a usufruirá. Como não deixar de ensinar e aprender tudo acima mencionado mas ainda assim ter a oportunidade de se constituir um cidadão global através das experiências da modalidade a distância. Não é preciso ser dicotômico e pensar sobre esse ou aquele, sobre presencial ou a distância. Tem-se que unir as metodologias com o objetivo de amplificar e qualificar a educação. Tanto o currículo que for desenhado, quanto gestão e manutenção desse novo ensino médio é que farão toda a diferença.
Fomentar o itinerário formativo e com isso se valer da EAD, se bem administrada, se transformará num instrumento valioso pensando justamente na integralidades desses alunos. Valorizar os trabalhos que são feitos além da escola, independente das porcentagens de ensino a distância para diurno, noturno ou EJA.
Principalmente, reconhecer nossa diversidade e saber os momentos oportunos da educação presencial e da EAD. Encarando como objetivos centrais o acesso e qualificação da educação.
Tecnologias Educacionais
Essa é uma temática que necessita de energia e esforços para pensar na sua melhor estruturação e propagação. Nossas escolas públicas e municipais, em grande número, ainda não contam com rede de Internet de qualidade, e muitas vezes nem contam com uma rede. Será preciso pensar estratégias para disponibilização de infraestrutura e equipamentos de qualidade que tenham condições de atender aos alunos e a comunidade.
Também, pensar quais serão os formatos dessa educação EAD, e como os estudantes se valerão dela. Nem sempre é necessário o acesso a um ambiente virtual, por exemplo. O trabalho também pode ser realizado através de relatórios, diários de bordo, cadernetas de acompanhamento que o professor analisa e retorna com feedbacks e planos de ação.
Há muitas formas de se pensar sobre tecnologias educacionais além de dispositivos e recursos digitais, basta planejamento e acompanhamento efetivos.
O que esperar dos próximos passos
Implementar uma política de EAD para o ensino médio não será tarefa fácil, pois além das questões pedagógicas temos também os fatores técnicos e tecnológicos, além dos culturais. É a primeira vez na história que se tenta tal modalidade neste ciclo escolar com tanta amplitude. Há os que apoiam e entendem como forma de aumentar o acesso e fazer com que mais pessoas tenham a possibilidade do diploma e há aqueles que acreditam na desqualificação e massificação de uma educação que forma analfabetos funcionais.
Acreditamos que através da EAD será possível fazer um trabalho em que, inclusive, tenhamos a capacidade de conectar etnias, regiões e culturas. No entanto, podemos dizer que seu sucesso dependerá significativamente da gestão escolar, política e da comunidade, apoiando e sendo presente nos debates e decisões.